As Crianças Com Deficiência E Aconselhamentos Junto Às Famílias No Processo De Educação E Reabilitação



Publicado em 04/02/2010



Quando um casal se une pelo matrimônio, é desejo de ambos a constituição de uma família. A cada gravidez, há uma nova expectativa: o sexo do bebê, a cor dos olhos, se vai ter a covinha como a do papai, se o cabelo vai ser parecido com o da mamãe… Enfim, são feitos projetos com relação ao filho que ainda vai nascer. Entretanto, muitas vezes há problemas que começam na própria maternidade, logo após o nascimento. Obstetra, anestesista, pediatra, enfermeiros e outros especialistas que acompanham o parto, ao perceberem alguma anormalidade na criança, acabam, às vezes, dando a notícia de um modo muito frio, sem se preocuparem, a priori, com o trauma que podem estar provocando.



Um abalo assim provocado, causa reações de choro, silêncio absoluto, tristeza, grito… Os pais acusam os médicos ou o hospital de serem culpados pelo fato. Ao se verem numa situação como esta, muitos se sentem angustiados, sozinhos e sem saber o que fazer. Têm sensação de culpa; sentimentos de infelicidade surgem inevitavelmente. Estas reações negativas e pessimistas frente ao fato dificultam, ainda mais, o momento, podendo gerar consequências maiores do que as reais.






Por outro lado, alguns pais, talvez mais estruturados, buscam informações exatas, evitando, assim, sofrimentos desnecessários.



Quanto ao choque e reações iniciais, temos o depoimento pessoal de Iva Folino Proença que, em seu livro “Posso ajudar você?”, narra a sua experiência. Segundo ela, depois de algum tempo do nascimento de seu filho, José Manoel, percebeu que algo anormal se passava com ele. Resolveu levá-lo a um médico que, após examiná-lo, disse simplesmente: “Esta criança é mongolóide”. Foi um grande choque, como ela mesma explica: “Vesti a criança e saí de lá como quem foge do inferno. Quando me vi na rua, mil coisas passaram pela minha cabeça, inclusive deixar aquele embrulhinho encostado num canto qualquer e ir embora; ou oferecê-lo a alguma pessoa daquelas centenas que passavam apressadas. Eu queria livrar-me daquele fardo – era pesado demais para mim. Atordoada, sem saber a quem recorrer para dividir minha aflição, lembrei-me da figura de meu sogro, muito paternal e amiga. Por que será?” (…)



Iva declara não ter aceito de início o problema de seu filho, tentando, muitas vezes, ocultar a realidade. Isto, porém, começou a mudar a partir de uma sacudida de sua amiga, que lhe disse: “Sabe o que mais, Iva? Pare de dizer que o José Manoel não anda porque é gordo. Crie coragem e enfrente a realidade. Ele não anda porque é uma criança diferente das outras. Quando perguntarem por que ele não anda, diga a verdade. Diga que ele nasceu com um problema e que vai demorar mais do que os outros para andar, para falar, para se desenvolver, enfim. Pare de mentir! Isto não faz bem para você, nem para ele, nem para ninguém”.



O problema das reações dos pais ao receberam a notícia de ter um filho com algum tipo de deficiência é que todas as famílias não estão preparadas para receber um membro fora dos padrões estabelecidos, principalmente porque recebem toda carga ideológica que reina no interior de nossa cultura. Surgem reações variadas: rejeição, simulação, segregação, superproteção, paternalismo exagerado, ou mesmo piedade, sentimentos naturais de medo, dor, desapontamento, culpa, vergonha, frustrações e uma sensação geral de incapacidade e impotência. Ter uma deficiência em nossa sociedade adquire uma conotação negativa do tipo será aquele membro que dará sempre muito trabalho, que viverá encostado às custas da família, dentre outras.



A participação dos pais na reabilitação



Talvez por problemas do dia-a-dia, sejam socioculturais ou mesmo uma falta maior de conhecimentos, os pais deixam de participar do desenvolvimento de seus filhos. Alguns, ao entregarem a criança a uma instituição, acham que alguém tem que fazer algo pelo seu filho e se acomoda. Neste sentido, cabe também aos próprios técnicos que trabalham pela criança lutar contra este tipo de pensamento e postura, mostrando que não cabe toda a responsabilidade pela criança à instituição ou à escola. Que cada um tem que assumir e desempenhar o seu papel.



O contato social começa dentro do lar. É importante que uma criança com deficiência se sinta bem ao lado de sua família que, por sua vez, deve levá-la a passeios e atividades fora do lar, de modo que, desde cedo, se inicie um processo de sociabilização.



No livro “Realidade”, a autora Dirce Bertachini e Silva, mãe rapaz com síndrome de Down, relata como enfrentou este problema: “O que sempre contou e conta em nossas vidas é a união. Sempre saíamos os quatro para os passeios, até mesmo nos campos de futebol, quando o Júnior fazia parar o jogo com suas corridas no meio do campo ou na igreja, dando mil voltas pelos bancos, nós não deixávamos de levá-lo. Ele sempre foi parte integrante da família”.



Um número muito restrito de amizades deixa a criança insegura e com problemas futuros de relacionamento. Não se deve criar qualquer tipo de preconceito ou discriminação dentro do próprio lar. Sendo ocultada, a criança, quando adulta, será uma desconhecida na sociedade em que vive com sua família, tendo, assim, menos chances de inclusão.



Como qualquer outra criança, também a que tem deficiência, sente-se insegura e cheia de dúvidas, procurando sempre a proteção dos pais, que nunca deverão negar esta segurança, mas sim encorajar a criança a crescer confiante em si mesma. Consequentemente, ela vencerá as suas próprias limitações. Ainda no livro de Dirce, ela relata como colaborou no processo de socialização de seu filho Evandro: “Costumávamos passear nas praças, visitar lojas; ele sempre foi muito curioso e olhava tudo com muita atenção. Era só ter paciência e explicar aos vendedores que ele estava só conhecendo os artigos. Quando ele emburrava que queria algum brinquedo, eu dizia: -Não, hoje estamos só olhando. Demorava um pouco, mas eu ia explicado e a birra passava. Não era fácil, mas era compensador. Passeávamos, ele conhecia as pessoas, as pessoas ficavam conhecendo-o”.



Sempre que possível, é importante a participação dos pais no acompanhamento do tratamento de seu filho. A integração entre pais e profissionais é fundamental, porque ninguém, além deles, conhece melhor o seu filho. São os pais que convivem 24 horas por dia e aglomeram informações valiosas para o aperfeiçoamento no tratamento. Esta colaboração traduz-se em um incentivo muito grande aos profissionais, estimulando-os a lidar com estas crianças. Este entrosamento é primordial para que ambas as partes (pais e profissionais) encontrem a melhor maneira de tratamento para a criança. Esta, por sua vez, observando a união entre eles, se sentirá melhor e terá maior confiança naqueles profissionais que a assistem.



Comportamentos negativos



Se de um lado, o tratamento dentro do lar é fundamental para o desenvolvimento da criança com deficiência, entretanto, há casos de superproteção por parte de alguns pais, o que prejudica na formação da mesma. A educação recebida pela criança reflete no seu futuro. No livro “Vida de quem não vê”, o autor, J. Espínola Veiga (com deficiência visual total), faz uma bela descrição sobre isto: “O filho vai dos três para os quatro anos, e nada lhe ensinam. Coitadinho, deixa! …Mexem-lhe o café, picam-lhe o pão, põem-lhe a comida na boca, descascam-lhe a banana, deixam-lhe que meta a mão no prato. Coitadinho! Já basta o que ele sofre! … E a criança não sofre nada com a falta da vista (…) Sofrerá, sim, mais tarde, a conseqüência dessa educação mal dirigida”.



Nota-se esse tipo de comportamento é maior nas mães, não permitindo que o filho sofra o mínimo de frustração que é importante para o seu desenvolvimento. Poderá deixar de lado sua vida para dirigir toda a sua atenção a esse filho. Como se não fosse mais digna de ter um momento para si, não consegue uma descarga adequada para as suas tensões e seu conflito aumenta. Isso se reflete com dificuldades no seu relacionamento conjugal e com os outros filhos.



A criança superprotegida pela mãe manifesta pode desenvolver tipos de comportamento: possessividade e egocentrismo; baixa tolerância à frustração; revolta ou apatia.



A interferência do psicólogo nessa relação mãe-filho deve ser cuidadosa, pois nem sempre ela se dará de forma tranqüila por haver uma vinculação muito forte entre ambos. A mãe precisará ser conscientizada que nesse trabalho estaremos avaliando o seu filho para poder ajudar a direcionar o processo de aprendizagem; orientar a família e os profissionais que estiverem atendendo a criança, visando facilitar para que esse processo se torne menos sofrido para todos os envolvidos.



Há casos em que os pais permitem que a criança faça tudo o que quiser. Muitas vezes, não a encaminha aos tratamentos necessários, simplesmente porque a criança diz “Pai, não quero ir!”. Dão tudo o que a criança pede, criando-a nesta superproteção. Ela não vive entre outras crianças, oportunidade essa em que poderia estar desenvolvendo psicomotor, as suas possibilidades, além da imaginação e faculdade intelectual. Assim, a criança crescerá com uma visão totalmente distorcida do mundo. Só conhecerá um mundo em que tudo é fácil, em que se tem tudo o que se quer. Os pais estão, assim, contribuindo para a sua regressão, não permitindo que suas potencialidades aflorem naturalmente.



Muitas crianças com deficiências são discriminadas pelos próprios pais que, ao saberem que seu filho nasceu com alguma deficiência, separam-se, não aceitando o fato de ter um filho assim. Há casos de pais que ocultam a existência desse filho; alguns, economicamente mais privilegiados, mandam construir casas em cidades vizinhas, enviando os seus filhos para lá, para ficarem aos cuidados de pessoas estranhas. Eles esquecem que aquela criança, seja qual for sua deficiência, também possui inteligência e talentos concedidos por Deus e precisa do apoio de seus pais para se desenvolver. A conscientização de que aquele é o seu filho, apesar da sua deficiência, e de que ele precisará do apoio parental para vencer é de suma importância.



Os irmãos



Algumas reações, dúvidas, perguntas e problemas podem surgir por parte dos irmãos. Sentimentos como ciúmes, inveja, raiva, superproteção, orgulho, culpa, preocupação, solidão e negação.



O modo como são criados os irmãos (com e sem deficiência) é fundamental: se ambos forem tratados naturalmente igual, o sem deficiência verá, a certa altura, que seu irmão tem algo diferente, por exemplo, no seu corpo, mas tratá-lo-á sem qualquer indiferença. Aceitá-lo-á em suas brincadeiras, orgulhando-se do irmão. Agora, se o tratamento for diferente, esse poderá vir a se sentir meio que marginalizado pelos pais, que superprotegem o filho com deficiência. Ele poderá até vir a discriminar o irmão superprotegido.



Alguns irmãos enfrentam dificuldades em relação aos amigos. É comum que estes amigos caçoem de outras pessoas com deficiência em sua frente. Ao cometerem algum erro, podem dizer que ele tem problemas que nem o irmão. Na presença deles, o irmão com deficiência pode fazer algo que envergonhe o seu irmão. Muitas crianças e jovens não fazem isso por maldade, mas sim por falta de informação sobre o que é uma criança com necessidades especiais.



Para finalizar, quero recordar uma frase de Hideco Watabe, professora que tive em uma escola especial no final dos anos 70s: “Lutar pelos deficientes físicos é um sonho. Acredito que o melhor caminha será a educação do nosso povo quanto à saúde; o esclarecimento aos futuros pais da necessidade de maiores conhecimentos quanto à concepção, nascimento e criação do novo ser, obrigando-os a ser prepararem conscientemente para a nova função: a de PAIS!”


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