CLÉLIA BONANI: Rumo ao mundo das letras!



Publicado em 16/08/2002



Formada em Administração de Empresas e pós-graduada em Informática, a paulistana Clélia Bonani, 33 anos, portadora de um problema de coordenação motora, causado por uma paralisia cerebral, diz ter dois objetivos principais pela frente: conseguir uma chance para se colocar no mercado de trabalho e encontrar uma editora para editar o seu primeiro romance, aspirando assim, uma carreira literária! Confia a entrevista que ela concedeu ao site Sentidos:



SENTIDOS: Conte-nos um pouco do início de sua história, seus primeiros anos de vida?



CLÉLIA: Sou a caçula de uma família de quatro filhos, netos de calabreses, onde todos, sempre e em qualquer circunstâncias, fomos condicionados ou ensinados, desde sempre a lutar muito por nossos ideais. Tudo isso dentro de padrões morais rígidos, tendo como base a honestidade, no sentido mais amplo possível.






SENTIDOS: Qual foi a origem de sua deficiência?



CLÉLIA: Minha mãe teve uma gravidez saudável, sem nenhum tipo de problemas. No entanto, passei alguns dias do tempo previsto. Mesmo sendo solicitado por ela, uma Cesariana. O que não foi feito, pois os médicos do hospital público em que eu nasci, alegavam a não necessidade. E quando, finalmente, ela entrou em trabalho de parto, foi pelo método Fóspse.  O que os médicos não sabiam é que o Cordão Umbilical estava enrolado um meu pescoço, daí originou-se a falta de oxigenação no celebro. O que comprometeu a Coordenação Motora e a dicção. Essa dificuldade começou a ser notada, acredito, depois de uns oito meses de vida, pois comecei a sentar um pouco mais tarde que o previsto. E assim, sucessivamente, nas demais etapas do desenvolvimento dito normal de uma criança. Com tudo isso, meus pais e meus irmãos se mobilizaram em torno de mim, onde o objetivo comum era o meu progresso e o principal interesse era que eu fosse o mais independente possível. Daí toda a preocupação em não me poupar, ou seja, ajudavam em minhas dificuldades. Entretanto, eu precisava fazer as coisas sozinha, com uma certa ajuda inicial, mas, sempre era visado a independência. É a tal história, me ensinaram a pescar e não pescaram para mim, e é exatamente por isso que devo muito do que sou a todos eles. Por isso também, creio que essa seja a fórmula ideal, essa é a meta até hoje, e é isso que eu recomendaria aos pais que estão vivendo uma situação semelhante! Por tudo, por não ter sido tratada como uma “coitadinha” que as coisas fluíram bem, estudei sempre em escolas públicas e seguindo os ensinamentos da minha mãe, a pessoa mais forte que eu conheci e como uma fé inabalável, tenho por principio, jamais me permitir qualquer tipo de concessão ou facilidade. Por isso, também, como já lhe falei, não uso e nem permito que se use o termo deficiente. Isso é um “rótulo”, um estigma que as pessoas passaram a achar lindo… Qualquer ser humano possui uma certa dificuldade ou problema físico, nesse aspecto, todos, sem exceção estamos equiparados. E todos podem fazer muitas coisas boas, cada qual, com suas dificuldade e a seu tempo.



SENTIDOS: Como foi a sua formação escolar e acadêmica?



CLÉLIA: Quanto a formação, estudei até o colegial, na época, hoje nível médio, em escolas públicas. Em classes normais, como todos. Lembro-me que no primário, havia classes, denominadas ‘especiais’, o quê nem sei dizer ao certo, o correto objetivo, se eram destinadas as crianças com problemas mentais ou não… Nunca tive problemas de aprendizado, muito pelo contrário, entrei no chamado “prezinho” com seis anos e meio, pois, naquela época, não eram aceitas crianças com menos de seis anos, e como faço aniversário no meio do ano… No entanto, já sabia ler e escrever, porque uma amiguinha três anos mais velha me ensinava, quando brincávamos de escolinha. Acredito que tive muita sorte, pois na época, o ensino público era de qualidade infinitamente melhor que a de hoje. Tive muitos bons professores, e nunca fui poupada de nada, muitas vezes cheguei a fazer provas de segunda época, sim, como todos! E como, ocorre na vida de todo mundo, as pessoas me ajudavam nas minhas necessidades, logicamente. Aliás, é nato do ser humano ajudar seu próximo quando o vê em apuros!



SENTIDOS: Em algum momento, você encontrou dificuldades?



CLÉLIA: O problema maior que tive foi quando passei no vestibular para psicologia na FMU, onde a direção dessa “escola”, obrigou-me a sair de lá. Fizeram todo o tipo de pressão possível e imaginável. Sumiam com minhas provas e trabalhos, obrigaram a mim e a meu pai, assinarmos uma ata de reuniões, onde dizia que eu não tinha capacidade de acompanhar o curso. Não me permitiram pedir transferência para outra faculdade, tudo isso no ano em que minha mãe estava hospitalizada, à beira da morte, vítima de um Câncer fulminante. Mesmo sabendo da situação a direção, alegava que estava me fazendo um grande favor, pois se eu viesse a me formar, nunca iria trabalhar na área. Anos depois, fiquei sabendo que fizeram algo parecido com uma menina que tem o mesmo problema que o meu…  Com essa brincadeira perdi dois anos de estudo, depois prestei vestibular para Administração, numa outra escola, onde, graças a Deus, nunca tive nenhum tipo de problema. Muito pelo contrário, lá fiz, também a pós-graduação.



SENTIDOS: E sua vida profissional?



CLÉLIA: Quanto a vida profissional, acredito ser meu maior desafio… Infelizmente, as pessoas julgam a capacitação profissional pela aparência. Já vivenciei muitas e muitas situações constrangedoras à busca de uma vaga no mercado. As empresas agora são obrigadas a manter um certo número de pessoas com problemas, em seu quadro de funcionários, além de pagarem pouco, exigirem muito, ainda põe pessoas, muitas vezes desqualificada para fazerem a seleção. Resultado, na maioria das vezes, humilham bem as pessoas que lá estão, as colocam em situações vexatórias para nada! No me caso, creio ter um curriculum razoável, mesmo assim, ouvi diversas vezes: “- Ele é bom, porém, você tem um problema físico…”



SENTIDOS: Como você descobriu a sua vocação de escritora?



CLÉLIA: Bom, desde de sempre gostei muito de estudar nossa língua. Mas, foi na quarta série que percebi, realmente, minha facilidade em escrever. Os anos foram se passando e isso foi fluindo naturalmente. Claro que a medida em que se estuda e se pratica a “coisa” anda melhor. E sempre procurei estudar mais e me aperfeiçoar mais. Depois de formada, comecei a trabalhar como autônoma nesta área, prestando serviços, inclusive, para professores, elaborando material técnico e didático. Anos depois, pensei: se tenho talento, criatividade, por quê não colocar tudo isso ao publico ver? E assim comecei… Lembro-me de um fato engraçado, no início da minha pós-graduação, tive que me esforçar muito, pois, era uma das poucas alunas da turma, a fazer especialização numa área diferente da formação. E numa das primeiras semanas de aula, precisei fazer uma resenha sobre um determinado assunto. No dia estipulado, levei meu trabalho mesmo sem ter certeza o que havia feito, estava mesmo correto. E antes de entregá-lo, um colega pediu para ler. Após terminar, ele me disse: “Poxa, você escreve bem!”. Comecei a rir, pois, mesmo sem ter absoluta certeza do conteúdo, o convenci que tudo aquilo era a pura verdade!



SENTIDOS: Fale um pouco do seu livro? Já tem previsão de lançamento?



CLÉLIA: Meu livro conta a história de uma jovem, que após o término de seu namoro com um rapaz dono de uma personalidade bastante difícil, e após a descoberta de sua gravidez, entra num processo de completa depressão. Após muita insistência de sua mãe, meses depois, ela resolve procurar a ajuda de um psicólogo. No decorrer de seu tratamento, ele sugere para que ela faça uma regressão de vidas passadas. Nessas sessões, ela descobre que seu envolvimento com esse rapaz, já se dava em uma outra vida. O final dessa história, intrigante, de fato, surpreende o leitor. Quanto ao lançamento… Ainda estou a procura de uma editora. Como lhe falei, meu livro chegou a ser aceito/aprovado por uma editora. Estive lá e tudo mais… Só que na hora da assinatura do contrato, o dono se recusou, alegando outros motivos. No entanto, aposto com quem quiser que o real motivo foi meu problema. E lhe digo mais, acredito que esse fulano tenha feito contato com outras editoras a fim de barrar meu trabalho, pois, fiz um “uaê” na empresa dele, legal né?



SENTIDOS: Quais os seus planos futuros?



CLÉLIA: O que pretendo é continuar procurando uma editora, tenho outras obras encaminhadas. Espero conseguir em breve publicá-las!


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