O Portador De Deficiência E A Consciência De Participação



(Publicado em 17 de julho de 1996)



No último sábado estive novamente reunido com o grupo que está criando o Centro de Apoio ao Portador de Deficiência de Bauru. Foi uma reunião bastante aproveitável, onde discutimos vários pontos e foram dados passos importantes; inclusive começamos a discutir o estatuto e as metas sociais da futura entidade, além de já termos escolhido a diretoria, cuja os nomes serão divulgados no momento oportuno.



O Centro nasce com vários objetivos já definidos, sendo que duas metas serão intensificar, sugerir e fazer cumprir as leis existentes a nosso favor e também trazer cada vez mais portadores de deficiência para somarem conosco e, consequentemente, fortalecendo o nosso movimento. E é exatamente sobre esses dois assuntos, que hoje peço, licença aos meus companheiros do Centro, para fazer as minhas Reflexões neste artigo.



Já que direitos e normas sociais existem em prol da pessoa portadora de deficiência, chamo a atenção do que é preciso ser feito para eles serem efetivamente cumpridas. Acredito como sempre, na necessidade de se investir mais na informação específica nesta área. Precisamos criar caminhos para que essas leis cheguem ao conhecimento de todos os envolvidos nesta temática, e das demais autoridades competentes. Esse será o primeiro passo de cidadania.



Tão importante quanto trabalhar com a sociedade, será necessário também, realizarmos um trabalho com os próprios portadores de deficiência para que se conscientizem e se reúnam em movimentos e Centros iguais ao nosso ou da sociedade em geral, para brigar e fazer valer esses direitos. Criar novas associações, entidades e outros meios para tal, pois pegando uma carona na Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes, parágrafo 7°, “as pessoas deficientes têm direito à segurança econômica e social e a nível de vida decente e, de acordo com suas capacidades, a obter e manter um emprego ou desenvolver atividades úteis, produtivas e remuneradas e a participai’ dos sindicatos”. E, em outro documento, encontraremos; “As organizações e outras entidades em todos os níveis devem garantir às pessoas portadoras de deficiência participação nas atividades na medida mais ampla possível”(PAM, Parágrafo 94). Acredito que só um movimento social, sem literalmente esperar que “algo caia do céu” e tendo a frente os próprios interessados, poderá trazer resultados positivos, pois aqui podemos citar um pensamento do sociólogo Herbert de Souza, o Betinho: “O país somos nós. Não podemos ficar com essa coisa de que a salvação vem de cima, de que a salvação é o Estado”!



É o próprio Programa de Ação Mundial para Pessoas com Deficiência, o PAM, quem diz em seu Parágrafo 25, que “o princípio de igualdade de direitos entre pessoas com e sem deficiência significa que as necessidades de todo indivíduo são de igual importância, e que estas necessidades devem constituir a base do planejamento social, e todos os recursos devem ser empregados de forma a garantir uma oportunidade igual de participação a cada indivíduo. Todas as políticas referentes à deficiência devem assegurar o acesso das pessoas deficientes a todos os serviços da comunidade”.



Precisamos tomar a consciência que os problemas das pessoas portadoras de deficiência, são, quase sempre, os problemas de todos os envolvidos nesta área Por isso, nasce a necessidade da união da classe, pois é errado incentivar um indivíduo a ir sozinho a busca de soluções para tais problemas, o que pode afetar, de uma certa forma, a convivência social. Ninguém vive sozinho e nem deve ignorar interesses comuns, principalmente para proteger seus interesses particulares. De forma geral, segundo Dallari (in: O que são direitos da pessoa), “cada indivíduo sofre influência da sociedade em que vive mas, ao mesmo tempo, exerce alguma influência sobre ela”. Com o deficiente não é, e nem pode ser diferente! “O simples fato de existir, ocupando um espaço, sendo visto ou ouvido, precisando vestir-se e consumir alimentos já é uma forma de influir. Por isso, todos os problemas relacionados à convivência social são problemas de coletividade e as soluções devem ser buscadas em conjunto, levando em conta os interesses de toda a sociedade”, refleti Dallari.



Existe ainda, a questão dos próprios portadores de deficiência terem a necessidade de tomar decisões. Essa é uma prática comum no dia-a-dia de qualquer pessoa; decisões são tomadas sobre todos os assuntos. Além dos assuntos corriqueiros, precisamos tomar decisões, desde a melhor forma de reabilitação, até em nosso movimento social, visando a integração. Muitos por motivo de comodismo ou pelo medo da responsabilidade de decidir, se calam. Dallari observa que “quase sempre essas pessoas procuram esconder o verdadeiro motivo, simulando desprendimento, dizendo que acatarão de boa vontade o que os outros decidirem”. Omitir-se, é uma fuga à responsabilidade, quase sempre, ligada à falta de consciência quanto à necessidade de vida social; perdendo assim, a oportunidade de participar de importantes decisões e preferindo deixar que outros decidem sozinhos assuntos que também trarão benefícios para si; permitindo ainda, que outros decidam em seu lugar, poderá acarretar grandes prejuízos e arrependimentos sem retrocesso. Isso precisa começar a ser evitado e combatido aqui nesta área



Chega daquela época onde só os profissionais, técnicos e doutores decidiam o que era melhor para o deficiente e isso era acatado como verdade absoluta. É preciso – e essa é uma nova tendência mundial – dar voz ao deficiente, para que ele diga o que é melhor para si, ao seu tratamento e em sua vida pessoal. Aliás, é preciso haver diálogo e consenso entre ambas as partes, pois “se todos reconhecerem essa necessidade e assumirem positivamente sua responsabilidade, os conflitos serão superados de modo mais justo e mais de acordo com as necessidades comuns, em benefício de cada indivíduo e de toda a sociedade”. Além que, “aqueles que denunciam uma injustiça está começando a destruí-la”. Precisamos saber que não poderá haver nenhuma grande mudança na sociedade, sem antes haver mudança de consciência de cada um, “pois o indivíduo conscientizado não fica indiferente e não desanima perante os obstáculos. Para ele a participação é um compromisso de vida, exigida como um direito e procurada como uma necessidade”(Dallari). O deficiente precisa em primeiro lugar tomar consciência de suas situações e limitações, para depois saber, melhor do que ninguém, como e para que agir. A exemplo ilustrativo, termino minhas reflexões lembramos o filosofo Marcuse, quando ele dizia que “o primeiro passo para um escravo conquistar sua liberdade é ele tomar consciência que é um escravo”.

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