Potencialmente dotadas de várias potencialidades e criativas, as crianças - seja qual for a sua deficiência -, sempre tem algo a oferecer à sociedade, que os "mitos" muitas vezes acabam por reprimir ou neutralizar. Como digo em meu livro “As Pessoas Com Deficiência Na História Do Brasil – Uma Trajetória Entre Silêncios E Gritos” (Watk Editora), ao longo de muitas décadas, desinformação colaborava para que as pessoas tenham uma ou mais dessas visões, ainda mais para quem tem uma deficiência intelectual: como sendo tristes e patéticas, destinadas a conduzir uma vida trágica e trazer tristezas a todos que as conhecem; como sendo eternas crianças, incapazes de crescerem e desenvolverem-se além da compreensão e dependência infantis; como "doentes" e precisando de supervisão médica; como "loucas", destituídas de razão ou incapazes de perceber seu ambiente; como anormalmente fortes, física ou sexualmente perigosas; como escolhidas de Deus - o que pode ser uma outra maneira de dizer que elas "não são iguais a nós".
São tipos de mitos que existiram - e ainda hoje existem - em torno dessas pessoas, como por exemplo, a Síndrome de Down. Elas foram durante décadas isoladas da sociedade, sendo muitas vezes criadas trancadas em quartos escuros. Após começarem a ser estudadas e estimuladas, romperam inúmeras barreiras e mitos desenvolvendo coisas e habilidades consideradas até impossíveis para sua condição. Hoje, nem mesmo a ciência se arrisca a pôr limites em suas potencialidades.
Dessa maneira, as entidades e associações que lidam com essas pessoas, devem trabalhar para apresentar uma imagem positiva a respeito delas, substituindo esses temores e preconceitos, permitindo que outras pessoas as vejam como: pessoas que sejam parecidas com quaisquer outras nas suas necessidades e sentidos normais, nunca diferentes; pessoas que podem aproveitar a vida e trazer felicidade àqueles que as conhecem; pessoas que, com a ajuda necessária, podem crescer em habilidades e fazer suas próprias contribuições à família e à comunidade; pessoas que merecem o mesmo respeito que qualquer outra pessoa humana.
São vários os meios utilizados para a divulgação das pessoas com deficiência, tais como pôsteres de propagandas, técnicas publicitárias e/ou tentativas de se colocar histórias no rádio, TV, jornais, revistas, meios digitais boletins ou trabalhos alternativos. Porém, o principal em questão não é o meio utilizado para veicular essas mensagens, mas sim o modo pelas quais são produzidas, visando que não ocorra o repasse de preconceitos. Essa é uma realidade não somente para técnicos (jornalistas, publicitários, etc.), como também há registros de "gafes" cometidas pelas próprias entidades.
Podemos dar uma explicação rápida. Começando pelas imagens, elas podem dizer mais do que as palavras. Temos que evitar publicações de fotos das pessoas com deficiências intelectuais ou outros tipos, tristes e patéticas, malvestidas ou descuidadas, isoladas do mundo ou deitadas, sem fazer nada, fazendo alguma coisa estranha ou com pouca dignidade.
As palavras (termos) utilizadas também são de grande preocupação. Seja ela falada ou escrita, pode ser pejorativa, repassar ou reforçar preconceitos ou discriminação. Muitas são condenáveis, mas podemos citar como exemplos, duas: Os termos "excepcional" e "mongoloide".
A ONU, através de alguns órgãos ligados a ela, fez uma revisão nos termos utilizados em todo o mundo e chegou à seguinte conclusão: Quando a gente diz que uma pessoa é "excepcional", estamos dizendo ao mesmo tempo, que ela é uma exceção na sociedade, ou seja, que é alguém que deve ficar de fora, não podendo se integrar como as demais.
Essa classe não é formada de pessoas doentes; são apenas pessoas com alguma limitação, e mesmo com ela, podem ter uma convivência na sociedade, desde que ambos se adaptem a essa convivência. O termo mais correto é "pessoas com deficiência", podendo ser ainda mais específica como "pessoas com deficiência intelectual, ou auditiva, ou visual, múltiplas deficiências”.
Como contado em meu outro livro “Psicologia e Inclusão – Intervenções psicológicas em pessoas com deficiência” (Wak Editora), o mesmo ocorre em relação a quem tem a Síndrome de Down. Quando foi descoberta em 1866, pelo inglês John Langdon Down, o mesmo considerou a Síndrome como um regresso às raças inferiores, criando assim o termo "Mongolian Idiots" (idiotas Mongóis). Esta expressão chegou ao Brasil e outros países como "Mongoloides". Amigos e essas próprias pessoas com a Síndrome, têm manifestado o desejo de se criar um termo que não os classifiquem como inferiores, que não seja usado nas ruas como sinônimo pejorativo de idiota total pelas pessoas consideradas normais. Assim ficou estabelecido que as expressões mais corretas são, por exemplo: "Maria tem Síndrome de Down". Ou "Beatriz é uma menina com Síndrome de Down". Ou pode-se usar também a palavra Down como um termo mais simples: "Antônio é uma criança com Down".
Às vezes, usamos termos que todo mundo usa, mas que sem sabermos, reforçam preconceitos. As palavras são expressões verbais criadas a partir de uma imagem que nossa mente constrói. E enquanto comunicadores, precisamos estar atentos a isto.
Os meios de comunicação de massa surgem como uma das alternativas para se criar e transmitir uma imagem positiva dessas pessoas dentro da sociedade. Porém a coisa não é tão simples assim. Mesmo tendo poder, aqueles que produzem informações, capazes de conquistar mentes e corações, poderão muitas vezes, apresentar o material trabalhado de forma positiva por uma entidade para divulgação, de maneira distorcida para o grande público, transmitindo a mensagem errada. Isto porque jornais, revistas, TVs e meios digitais, possuem suas próprias ideias do que são pessoas com deficiência, e como qualquer membro da população passível de erros de interpretação com relação, por exemplo, à deficiência intelectual. Isto também pode ocorrer porque repórteres, fotógrafos e editores, têm o seu orgulho profissional e querem, muitas vezes, colocar sua própria interpretação no material que lhes é oferecido.
Mesmo assim, existem coisas que nós podemos fazer para ajudar os meios de comunicação a apresentarem pessoas com deficiência intelectual de uma maneira positiva. Faça com que a imprensa saiba que nós consideramos o que eles dizem sobre pessoas com deficiências intelectuais é importante e o porquê. Se uma história nos meios de comunicação reafirma um dos mitos negativos sobre quem tem deficiência intelectual, ou refere-se a eles de maneira depreciativa (como chamar pessoa com Síndrome de Down de `mongoloide', ‘incapazes’, ‘retardados’ por exemplo), temos que enviar mensagens, mostrando-lhes onde estão os erros: os meios de comunicação desejam ser populares com seus leitores, ouvintes e espectadores; assim, eles, provavelmente, notarão esta reação, corrigirão e não cometerão mais os mesmos erros.
É verdade que não existe uma imagem neutra de uma pessoa deficiente intelectual. Se ela não for deliberadamente construída de uma maneira positiva, as pessoas continuarão a ver essas pessoas de acordo com suas preconcepções negativas, não importando se isto é intencional ou não.