A Presença Da Pessoa Com Deficiência Visual Nas Artes IV



Publicado pela Rede Saci – São Paulo-SP, em 01/08/2003



ARTES PLÁSTICAS



 Museus



Na Espanha, existe o Museo Tiflológico de Madrid, único no mundo totalmente adaptado para os portadores de deficiência visual. Em um dos textos de seus catálogos, assinado pelo Chefe do Secção de Cultura, Felipe Ponce Rodríguez, o autor diz: “Em um despertar dos sentidos, ante as mensagens, com que o visitante encontra nas salas do Museo Tiflologico, a luz, o som, o calor e o tato, surgem oposições que, em outros contextos mais tracionais, se encontram longes de conceitos como surpresa, participação, integração e inclusão hedonismo”…



Aqui no Brasil, dentro do Instituto Benjamin Constant, há um museu predominantemente de caráter pedagógico, permitindo a visita de seus alunos e visitas orientadas no período de festividades de aniversário da Instituição. Abriga em seu acervo peças que contam a história do Braille, desde a época do Império até os nossos dias. Mas é de São Paulo, uma outra iniciativa…






 Projeto “Museu e Público Especial”



Criado em 1992, temos  no Brasil o Projeto “Museu e Público Especial“, da Divisão de Ação e Extensão Cultural do Museu de Arte Contemporânea/USP. Trata-se de um programa permanente de atendimento ao público portador de deficiências sensoriais, motoras e mentais e portadores de distúrbios emocionais em exposições especialmente concebidas e adaptadas para receber este público, que de forma não somente visual, mas também sensorial poderá apreciar e explorar as obras de arte através do tato.



Denominadas “O Toque Revelador” – sendo que a primeira contou com doze esculturas selecionas e intitulada “O Toque Revelador: Esculturas Contemporâneas”, essas exposições são compostas por uma seleção de obras de arte pertencentes ao acervo do museu, organizadas segundo um “percuso tátil“, permitindo tanto a exploração sensorial das obras tridimensionais originais como também das reproduções visuais-táteis em relevo, elaboradas à partir das obras bidimensionais originais.



Já a exposição “O Toque Revelador II: Escultaras em Bronze” – realizada em 1993 -, dez esculturas estavam organizadas em pares, sugerindo um diálogo onde a temática das obras e suas linhas estruturais semelhantes se confrontavam com a diversidade de texturas em bronze propostas por esculturas contempôraneas de Pierre Charbonnier, Marta Colvin, Ernesto de Fiori, Sônia Ebling, Agenore Fabbri, Felícia Feirner, Marcello Mascherini, Pola Rezende, Theodore Roszak e Liuba Wolf.



Posteriormente, ao comemorar sete anos de existência do projeto, foi realizada uma exposição com seis obras tridimensionais com características abstratas, pertencentes ao acervo do MAC. A curadoria incluiu réplicas de obras de Hidekazu Hirano, Karl Hartung, Laci Freund, Nicolas Vlavianos Rubens Valentin e Walter Linnk. Todas em tamanhos iguais ou proporcionalmente reduzidas das obras originais, permitindo a manipulação e derem manipuladas como um quebra-cabeça tridimensional.



Existe também os projetos extra-muros. Ampliando o atendimento ao público especial, que por dificuldades de acesso ou por limitações físicas fica impossibilitado de participar dessas atividades, o Museu, a partir de 1997, passou a realizar exposições itinerantes. Composta por exposições e treinamentos especializados para educadores e profissionais, responsáveis pelo atendimento do público em sua região, formam o projeto, atingindo não só outras cidades do Estado de São Paulo, como também de outros estados brasileiros.



Há título de citação, em 1997, foi realizada a exposição itinerante “O Toque Revelador –  Alfredo Volpi“, no colégio SETA em Jacareí, SP e recentemente, em 2001, “O Toque Revelador – Retratos e Auto-retratos”, na Casa da Cultura de Praia Grande – SP. Outro exemplo prático foi “O Toque Revelador – Retratos e Auto-Retratos“, exposição itinerante realizada em maio de 2001 na cidade paulista de Rebeirão Preto. Nela, os monitores desenvolveram todo um trabalho antes do grupo conhecer as obras, falando um pouco sobre retratos, auto-retratos e pinturas, apresentando e abordando a história do retrato desde os faraós, no Egito, Grécia, retrato realista, pintura de gênero, onde os artistas pintavam cenas do cotidiano. Explicavam o que é um auto-retrato e o primeiro auto-retrato, a chegada da fotografia e a crise do retrato na pintura fazendo com que o artista buscasse uma nova forma de pintar: “O Impressionismo”, escola onde o artista passou a criar sobre as imagens, a transformá-la com intuito de demonstrar a emoção através da pintura.



Ao falar sobre pintura, explicaram o que é uma tela e todo material abordado era apresentado ao visitante ele a conhecesse através do toque. Várias telas pequenas com tinta a óleo foram apresentadas, uma em especial, onde passando a mão de cima para baixo para percebia-se a mudança do áspero(tinta menos misturada) para o mais liso, tela preparada para a pintura e pranchas em borracha de rostos de perfil, frente e meio perfil (quando eram crianças exemplificava-se dizendo que, quando de perfil, dá para ver somente um olho e uma orelha, de meio perfil os dois olhos mas somente uma orelha e de frente os dois olhos e as duas orelhas).



Os grupos conheciam as oito obras expostas, dentre elas alguns auto-retrato, além da fotografia das obras e a tinta na parede. Havia em uma mesa (adaptada para cadeira de rodas) reproduções elaboradas em relevo (papel machê e borracha), onde os visitantes eram solicitados a tocar em todas as obras; outros sentavam ao chão e questões eram levantadas pelos monitores como qual a obra mais bonita, qual está de perfil, meio perfil ou frente, qual é homem ou mulher, o mais alegre, o mais triste. Duplas eram formadas e o que estava de olho vendado, dizia qual era o quadro somente a partir do toque em uma prancha com a sombra da obra. Ao final, os visitantes recebiam o catálogo da exposição a tinta ou em braille.



No geral, essas exposições são contempladas por uma museografia adaptada principalmente ao acesso dos portadores de deficiência s visuais e motoras, e uma programação visual contendo textos, etiquetas e catálogos em tinta e Braille.



Sob a coordenação da arte-educadora Amanda Pinto da Fonseca Tojal, o “Museu e Público Especial”, conta com outras propostas como de Ação Educativa, objetivando motivar e ampliar o conhecimento da arte para os deficientes visuais, tais como: visitas orientadas por educadores, com atividades específicas elaboradas e adaptadas às necessidades dos participantes, incluindo a utilização de material multisensorial, bem como, a realização de atividades práticas ao final de cada visita. Além de oferecer à comunidade assessorias, cursos e palestras, dirigidas principalmente a estudantes e profissionais ligados às áreas de Arte Educação Especial e Educação em Museus, bem como exposições itinerantes e intercâmbios culturais e educativos entre escolas e instituições públicas e privadas.



Certa vez, a ensaísta Helen Keller declarou que participava da beleza escultórica mesmo sem ver as formas. Em sua obra “The story of my life” (New York, Dover Publications, 1996, p. 9), ela afirmou: “Eu, às vezes, imagino se a mão não é mais sensível do que o olho para perceber as belezas da escultura. Eu deveria pensar que o maravilhoso fluxo rítmico de linhas e curvas poderia ser mais sutilmente sentido que visto. Seja como for, eu sei que posso sentir as batidas do coração dos antigos gregos nos seus deuses e nas suas deusas de mármore”



Segundo João Vicente Ganzarolli de Oliveira, professor Departamento de História e Teoria da Arte da Escola de Belas Artes da UFRJ, cumpre destacar que, no Renascimento, o escultor Lorenzo Ghiberti manifestava opinião aparentada com a de Helen Keller, ao descrever uma estátua romana: “quando o olho acreditava ter esgotado a beleza da estátua, o tato descobria nela novas perfeições”. (Apud José Pijoan. Historia del arte, 3ª ed., Barcelona, Salvat, 1949, t. III, p. 79)



Do mesmo professor citado é a autoria de três artigos bem interessantes, publicados pela “Revista Benjamin Constant” e que merecem ser documentados:



“Arte e Visualidade: A Questão da Cegueira” (edição nº 10), combinando experiências concretas e dados teóricos, visa a contribuir para novas reflexões sobre o tema e o ingresso das pessoas cegas no mundo da arte;

“Sobre a experiência estética de pessoas portadoras de deficiência: uma abordagem semi-aristotélica” (Edição nº 11), reproduzindo uma palestra pronunciada no dia 3 de setembro de 1998, na cidade eslovena de Ljubljana, por ocasião do XVI International Congress of Aesthetics. Seu título original é Handicapped people and the experience of beauty: a quasi Aristotelian approach e

“Do essencial invisível” (edição nº 14), abordando a cegueira e a sua real aceitação na sociedade, dando ênfase às potencialidades artísticas da pessoa cega, bem como à importância essencial de dar sentido à vida humana em toda e qualquer circunstância.

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