ENVELHECENDO EM UM PAÍS QUE DESCONHECE A MINHA DEFICIÊNCIA – Por Emílio Figueira

 

#paracegove Recorte pequeno de corpos de três idosos sentados. Uma senhora repousa a mão no punho de um senhor que segura uma bolinha de tênis amarela. Foto: Reprodução

Hoje lembrei-me de uma pessoa que conheci que não aceitava as consequências de sua idade já avançada. E vivia dizendo: “Antigamente eu não era assim...” E como essa pessoa, há muitas.
Nas últimas décadas, a população brasileira e mundial estar envelhecendo. Fato reconhecido não só pelos especialistas de demografia, mas por todos. Como consequência desse fenômeno, é grande o número de pessoas que passaram a experimentar limitações funcionais, em função do envelhecimento.

Ainda que a chegada na terceira idade não signifique necessariamente perda da qualidade de vida, é inconteste que muitos idosos, no Brasil, estão longe de viver um processo de envelhecimento ativo e saudável. Isto ocorre em função do estilo de vida precário a que foram submetidos na infância, juventude e idade adulta.
Olhando-me nesse contexto, como todos, vivi uma adolescência totalmente ativa, cheia de aventuras. Depois, morando em Bauru, tive uma vida independente de sair sozinho às ruas, tomar ônibus, atravessar avenidas, fazer compras, morei sozinho por um ano e meio. Devagar ia desenvolvendo minhas próprias técnicas em conhecer cada rua, avenida ou cruzamento, os pontos e momentos certos para atravessar. Quando chegava a uma esquina e o semáforo estava fechado, esperava ele abrir e fechar de novo. Fazia longas caminhadas por toda a cidade.

Mas as coisas mudam. Digo isso porque completei 50 anos de idade. Algumas particularidades começam a surgir.  Claro que, como qualquer pessoa, eu não tenho mais a vitalidade dos anos anteriores. Ao mesmo tempo, estou participando de um momento histórico.

Até uma geração antes da minha, pessoas com deficiência morriam jovens pela falta de conhecimento, pesquisas, uma medicina não avançada, medicamentos adequados, melhores condições de recursos e humanos, tecnologias reabilitacionais, dentre outros fatores. Avançamos muito, embora temos muito que avançar. Isso faz toda a diferença.

Consequência de uma vida mais participativa, prazerosa, com mais sentido e, finalmente, com melhor qualidade. Em um de seus artigos a minha amiga e jornalista Lia Crespo, pioneira do Movimento Político das Pessoas Com Deficiência no Brasil escreveu: “Nós somos a primeira geração de deficientes no país que vamos enterrar os nossos pais!”

Todo esse movimento de Inclusão é muito válido, mas tem um ponto que pouca gente se atenta. Ele só foca em crianças, jovens em idades escolar e pessoas com deficiência ingressando no mercado de trabalho. Não existe quase nada no Brasil sobre o nosso envelhecimento.

Dentro do próprio movimento reivindicatório das pessoas com deficiência é cada vez maior o reconhecimento de semelhança na experiência de envelhecer para pessoas com e sem deficiência e, entre as suas necessidades de suporte para uma vida independente. Ambientes acessíveis, disponibilização de cuidadores, de ajudas técnicas e outros serviços de apoio ao cotidiano são necessidades compartilhadas por pessoas idosas e por pessoas com deficiência.

O fato é que estou envelhecendo em um país que desconhece a minha deficiência. A saída foi eu procurar minhas próprias alternativas, aceitando-me positivamente. Adaptando-me ao o que meu corpo vai ditando.

E quanto àqueles que dizem “Antigamente eu não era assim...”, é uma pena eles enxergarem o quanto a idade e o amadurecimento agregam em nossas vidas. Envelhecer é uma arte para os bem-resolvidos!

Até mais vê!

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