#pracegove – pasto verde com árvores ao fundo, dois cavalos em primeiro plano, um marrom claro, outro marrom escuro. Estão com as cabeças encostadas celebrando a amizade. Foto: Reprodução |
“Na estrada de minha casa há um pasto. Dois cavalos vivem lá. De longe, parecem cavalos como os outros cavalos, mas, quando se olha bem, percebe-se que um deles é cego. Contudo, o dono não se desfez dele e arrumou-lhe um amigo - um cavalo mais jovem. Isso já é de se admirar. Se você ficar observando, ouvirá um sino. Procurando de onde vem o som, você verá que há um pequeno sino no pescoço do cavalo menor. Assim, o cavalo cego sabe onde está seu companheiro e vai até ele. Ambos passam os dias comendo e no final do dia o cavalo cego segue o companheiro até o estábulo. E você percebe que o cavalo com o sino está sempre olhando se o outro o acompanha e, às vezes, espera que o outro possa alcançá-lo. E o cavalo cego guia-se pelo som do sino, confiante que o outro o está levando para o caminho certo”.
Essa fábula mexeu muito comigo. Parece ser um espelho da minha amizade com muitos amigos que conheci a partir de abril de 1981, quando fui morar em Guaraçaí, uma cidade bem pequena e longe da capital paulista. Éramos crianças sem ter a mínima desconfiança que o bondoso Deus estava iniciando ali lindas e fortes histórias de amizades.
Hoje não consigo imaginar como teria sido a minha vida e desenvolvimento pessoal sem a convivência desses amigos que amo de coração. Foram oito anos de muitas realizações e tudo de bom que poderíamos ter vivido em nossas adolescências, onde eu era totalmente incluído em todas as brincadeiras e atividades.
Fazendo uma metáfora com a televisão, nossa vida é formada por várias novelas e nós sendo escalados para diversos elencos. Quando crianças, nossa turma é uma. Na escola conhecemos novos amigos que vão entrando e saindo do nosso círculo ao longo das séries, da adolescência, da vida universitária. Somos escalados para as ilusões e desilusões amorosas. Companheirismo os mais variados. Alguns fazem papéis de mocinhos, mocinhas. Outros preferem ser os vilões.
Algumas pessoas voltam em outros momentos de nossas vidas. Outras se vão e nunca mais sabemos delas. Há as que deixam para sempre esta existência, tornando-se saudades. Os elencos mudam quando mudamos de casa, de bairro, de cidade, de estado, de país. Na vida profissional, cada trabalho será uma formação diferente de elenco. A vida é assim, uma constante escalação para vivermos papéis e situações as mais variadas com risos, choros, perdas e ganhos.
Às vezes planejamos desembarcar de uma novela. Outras vezes, somos surpreendentemente “expulsos“ dos elencos. Alguns lidam bem com essas viradas inevitáveis nas esquinas da vida. Outros, mais apegados e tementes em sair da zona de conforto, temendo o novo, sofrerão por não entender que este é um mecanismo na arte de viver e aprender naturalmente com o amadurecimento.
E em todos esses papéis, algumas vezes somos o cavalo cego guiado pelo som do sino daqueles que Deus coloca em nossas vidas. Outras vezes, somos o cavalo com o sino no pescoço que guia, ajudando outros a encontrar seus caminhos.
Ao longo dessas décadas, tantas amizades e reencontros estão florescendo em minha vida. Umas passageiras, outras duradouras que ficarão para sempre. Meu coração é assim, um enorme galpão de fazenda que sempre terá espaços para quem quiser se achegar. E, mutualmente, guiarei ou me deixarei guiar por todos vocês como se eu fosse àquele cavalo cego ou seu amigo.
E se me perguntarem qual o papel que mais amo interpretar na vida, responderei com certeza: o sempre divertido e alegre bobo da corte!
Até mais vê!
Área
Crônicas 2020 à 2021